16.3.11

Por que os chatos adoram Marx


“Half the harm that is done in this world
Is due to people who want to feel important”

“Metade de todo o mal deste mundo
É devido a pessoas que querem sentir-se importantes”

T. S. Eliot

A teoria do Marx pode ser muito antipática, muita gente sente arrepios ao ouvir coisas como reforma agrária ou sindicalismo, mas não é esse o caso. Bem, também não sou totalmente simpático aos métodos dele, mas  acho que o teórico em questão e, principalmente, muitos dos seus seguidores estão preocupados com os grandes sofrimentos da humanidade e não há nada mais legítimo que isso. O problema que eu queria discutir é o potencial que a teoria tem para alimentar egos famintos por qualquer coisa, exceto  por tentar solucionar os problemas do homem. Mas antes de explicar o porquê, é preciso esclarecer duas coisas mesmo que, num primeiro momento, não pareçam estar diretamente relacionadas ao assunto.


A primeira é que a maior satisfação do homem na Terra é sobressair-se. Mais que estar seguro, mais que amar, mais que se divertir, mais do que qualquer coisa. O que mais apraz um ser humano é a sensação de ser superior aos outros. Para quê? Para nada. Como nos ensinou O'Brien, personagem do 1984 do George Orwell, "o objetivo do poder é o poder", ou, no nosso caso, o objetivo da superioridade é a superioridade. Outro dia, folheando uma revista de divulgação científica, li que, de acordo com uma pesquisa, a riqueza não traz felicidade, o importante mesmo é ser mais rico que as pessoas do seu convívio. O importante é estar acima.


O segundo esclarecimento diz respeito à relação entre a superioridade e a crítica. Há muitas formas de sentir-se superior e uma das melhores é criticando. Isso acontece porque quando criticamos algo soamos como se entendêssemos muito do assunto, fazendo com que nossos camaradas melhorem suas opiniões a nosso respeito, gerando o desejável efeito que acabamos de conhecer.


O marxismo se encaixa nisso tudo devido a um de seus pontos centrais. Ele diz que a posse é a raiz de todos os males e por isso deve ser erradicada, e é tarefa do estudioso sério criticar esse aspecto da vida das pessoas que, hoje em dia, tornou-se um de seus elementos mais importantes, penetrando em todos os cantos do cotidiano. Ou seja, se a posse está por todo lado, e os marxistas têm que criticá-la, eles têm que criticar quase tudo na sociedade, e quando essa investigação é feita de forma séria, constitui um objetivo muito nobre.


Porém, para aqueles interessados em alimentar seus egos, para aqueles interessados em girar seus olhos para o chão por gozo e desprezo pelos demais, esse aspecto do marxismo é um sonho de consumo. As vantagens são inúmeras. Por exemplo, ao descobrir uma iniciativa nova para atacar um problema, a reação imediata do marxista chato é fazer alguma crítica, mesmo que ele não tenha parado para refletir sobre a questão, afinal, nada que não seja a completa reestruturação mágica e instantânea da sociedade pode surtir qualquer efeito positivo. Mas criticar  com segurança não é a única vantagem do marxismo pentelho, você também não é obrigado a propor nada de concreto,  felizmente infelizmente a única solução viável é impossível, primeiro porque, naturalmente, mágica não existe e, depois, porque ela é detida pela ignorância do povo. Além disso, todas essas críticas bestas e falta de propostas sempre se escondem atrás das teorias sérias de esquerda, tudo fica justificado pela imagem de crítica progressista genuína, ninguém nunca poderá acusá-lo sem acusar todos os segmentos anti-capitalistas. Assegurando máxima proteção contra investidas como a feita aqui, o marxista chato pode azucrinar à vontade. Ou seja, responsabilidade zero, segurança garantida e vanglória máxima!


No entanto, esse sentimento de superioridade não elimina necessariamente o gosto pelo agrupamento. Na verdade, é muito comum que os dois se combinem, que o chato recorra ao seu elevado grupo para defender-se e encontrar um pouco de camaradagem, já que acabam atraindo a antipatia de todos os outros.


Na faculdade, esse tipo era incomodamente comum e eu tinha a impressão que muita gente escolhia suas linhas teóricas pelos motivos que descrevi acima, ou seja, não as escolhiam pela coerência que elas apresentavam, mas  por vontade de fazer parte de um grupo ou de participar das delícias da segurança da maledicência pseudo-progressista. Imagino quanto das teorias que são favorecidas na Academia, o são não pela sua consistência mas pela capacidade de fazer o intelectual que aderir a suas propostas sentir-se maior que os demais, de fazê-lo sentir-se importante. Se tivéssemos consciência de que esse sentimento nos move e fizéssemos um esforço - mesmo que mínimo - para reduzir sua força em nossas motivações, o próprio marxismo seria o maior beneficiado.

4 comentários:

  1. acho q vc devia mandar pro lynn...
    vc tentou se segurar, mas no decorrerdo texto foi ficando mais bravo.
    ótimo texto!

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  2. Muitomuito bom, Lê! [2]

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  3. Adorno era um Marxista chato de gabinete, igualzinho o que você descreveu (aliás, acho que todos os teóricos da escola de Frankfurt o eram).

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