31.10.10

Tropa de Elite 2


Quando o primeiro Tropa de Elite saiu, ele foi um alívio pelo menos num sentido: ele não era um filme para gringo ver. As favelas, a violência, os traficantes e a polícia não eram problemas apresentados a uma platéia que ignorava essas questões, mas que estava cansada de ter que as olhar na cara todo dia. Na sequência, isso continua e podemos reconhecer brasileiros famosos como o jornal Lance e o apresentador de telejornal sensacionalista.

O fato de ser um filme para brasileiro contribuiu para o sucesso. Mas mais do que só reconhecer a realidade nas telas muita gente aplaudiu as balas do capitão Nascimento, o que era muito estranho para um filme concebido como crítica ao autoritarismo da polícia e não como elogio.

Mas o mais esquisito de tudo isso era mesmo a acusação contra o diretor, José Padilha, de aderir ao ponto de vista do seu protagonista e narrador. Poxa, no país de Machado de Assis, acreditar num narrador como o capitão Nascimento é muita mancada. Acusações parecidas ouviram o diretor de Clube da Luta, também acusado de compactuar com as soluções fáceis e sangrentas de seu personagem principal; agora, por que isso acontece a alguns diretores, mas não a outros, como Coppola e Scorsese, é uma coisa que eu não entendo bem, mas chuto que seja devido às posições dos seus realizadores. Imagino que os últimos estivessem mais bem protegidos atrás de seus nomes famosos.

Bem, a posição de Padilha quanto à violência  estava mais ou menos clara, mas a questão da intersecção das opiniões do diretor e do capitão Nascimento se complicava na crítica ao Foucault. O filme realmente parecia simpatizar com a atitude do protagonista quando ele empurrava a cara do playboy hipócrita na ferida do cadáver do traficante. 

Mas o que os gringos acharam disso? Muitos disseram no Rotten Tomatoes que o que ele propunha era uma polícia fascista como solução para a violência. E o segundo filme veio também para comentar essa repercussão do original. Nessa sequência, o povo aplaude o capitão como aconteceu de fato, mas sua política de guerra contra o tráfico falha terrivelmente e os policiais honestos do batalhão continuam colocando a cabeça dos traficantes no saco, mas, desta vez, as respostas não vêm. A posição do narrador mudou e ele aceitou as complexidades da realidade brasileira, agora não há mais espaço para ambiguidade, pelo menos não na amizade entre o diretor e um narrador super-violento.

Padilha escancara a desaprovação à conduta do protagonista mas parece continuar com a crítica ao Foucault, que agora também tem um representante, o professor universitário Fraga. Por não aderir a nenhuma das posições, o filme foi acusado de niilismo. Ele pode não estar decidido quanto aos seus heróis, mas com certeza está certo quanto ao inimigo e talvez essa seja a melhor conclusão para levar para casa. O filho que tanto Fraga quanto Nascimento estão tentando criar é o mesmo, e se há uma característica comum e importantíssima em ambos - e em como educam seu filho - é a incorruptibilidade. Os dois lados têm diferenças e um está mais certo que o outro, mas acho que se houve algo que foi feito com a franqueza necessária mas sem abrir mão de levantar todas as complexidades - e não acho ingênuo da minha parte - foi a  velhíssima crítica à falta de caráter. Nos covis em que Nascimento e Fraga se metem, não há lugar para meias morais, o inimigo continua sendo o mesmo que sempre foi: os interesses individuais acima de qualquer escrúpulo, e, quanto a isso, o filho de Fraga e Nascimento não tem dúvida de como proceder, e é nele que o filme põe sua magra esperança.

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